Vamos de Epicuro e A Única Coisa para aprender a tomar decisões melhores e priorizar o que realmente importa.
Quando escolhi estudar física e, depois, filosofia, era movido por um desejo: entender como as coisas funcionam. Eu acreditava que apenas a sabedoria poderia me levar a uma vida feliz. Resultado? Durante anos, devorei os clássicos da filosofia e fui embalado por um idealismo puro. Só que, em algum momento, percebi que essa busca precisava de utilidade prática.
O idealismo puro é aquela ideia romântica de buscar a perfeição e esperar o cenário ideal. Só que o mundo real exige imperfeição e ação. Grandes ideias só se tornam grandes realizações quando enfrentam o atrito da realidade. Lembre-se: melhor o feito do que perfeito não feito.
Aqui está um ponto crítico: no geral, os homens práticos e utilitaristas contemporâneos adoram repetir a crítica de que “a filosofia não serve para nada”.
Afinal, como meia dúzia de velhos gregos sentados em togas pode ajudar na minha semana cheia de entregas atrasadas?
É uma boa pergunta. Mas, na prática, a filosofia ensina a tomar boas decisões.
Desde os primeiros filósofos, no princípio de todas as escolas de pensamento, está o ímpeto de tomar boas decisões e alcançar a autonomia moral. Seja a prudência de Aristóteles, a serenidade dos estoicos, o controle dos prazeres de Epicuro ou a razão defendida pelos modernos – o critério é a variável que conecta a teoria à prática.
No fundo, a busca pela sabedoria sempre foi a busca por ações mais acertadas e decisões melhores.
Querem um exemplo? Vamos de Epicuro.
Epicuro, Ataraxia e o Foco no Necessário
Epicuro buscava a ataraxia – um estado de tranquilidade alma. Para ele, um homem feliz é aquele que nada o perturba e o caminho para alcançar esse equilíbrio estava em categorizar nossos prazeres e focar apenas no necessário. Assim, ele dividiu as ações da vida em:
- Naturais e Necessárias: o básico que mantém você vivo e funcionando. São ações que garantem a sobrevivência e o bem-estar essencial.
- Comer alimentos simples para matar a fome (não o combo duplo do Big Mac).
- Beber água para hidratar (não um drink de R$50 com folha de ouro).
- Dormir bem para descansar o corpo e a mente.
- Naturais e Não Necessárias: prazeres bons, mas não essenciais. A vida não acaba sem eles, mas convenhamos, eles deixam tudo mais legal.
- Uma refeição elaborada e cheia de sabores – tipo uma bruschetta gourmet, quando um pão e azeite resolveriam.
- O sexo, que é natural, mas você consegue sobreviver sem (apesar do drama de alguns).
- Tomar uma taça de vinho com amigos em vez de apenas beber água em casa.
- Não Naturais e Necessárias: essas são as tarefas que não são prazerosas naturalmente, mas ainda importantes para viver bem. Gera esforço, mas traz resultado.
- Fazer exercício físico: ninguém acorda saltitante para correr às 6h da manhã, mas manter o coração funcionando é relevante, né?
- Trabalhar para pagar boletos: odiado por muitos, mas necessário. Se você não trabalhar, Epicuro não vai te salvar da cobrança do aluguel.
- Estudar e se qualificar: não é a coisa mais divertida do mundo, mas a longo prazo, aumenta sua autonomia e resolve a vida.
- Não Naturais e Não Necessárias: ruído puro. São os prazeres artificiais, cheios de estímulos e zero utilidade real.
- Passar horas no Instagram rolando a tela e comparando sua vida com a dos outros.
- Gastar dinheiro com produtos desnecessários, como uma “bolsa em formato de avião por R$360 mil”.
- Assistir 10 horas de reality show de gente que você não conhece discutindo sobre quem comeu mais arroz.
Epicuro, no fundo, queria que você vivesse mais como um monge zen do que como um participante de um after rave. Para ele:
- Se algo é necessário, faça!
- Se algo é dispensável, pense bem.
- Se algo te custa caro, tempo e saúde, saia fora.
E lembre-se: comer um pão com azeite é melhor do que ter um banquete de ressaca no dia seguinte.
Epicuro sabia das coisas.
A Aplicação Prática: Complexidade x Necessidade
No nosso contexto de gestão e produtividade, a lógica pode ser aplicada diretamente. Há ações que são:
- Básicas e Necessárias: Tarefas simples, de impacto direto, que destravam o fluxo do dia.
- Básicas e Não Necessárias: Tarefas dispensáveis – o ruído que só ocupa tempo.
- Complexas e Necessárias: Desafios grandes que exigem atenção e trazem resultados.
- Complexas e Não Necessárias: Ideias mirabolantes que parecem boas, mas não movem a agulha.
Trabalhar com as horas dos outros: uma tarefa básica e prioritária
Aqui vem o ponto mais importante da reflexão: um líder deve sempre começar o dia trabalhando com as horas dos outros.
O que isso significa? Antes de mergulhar nas tarefas complexas que exigem foco individual, você precisa organizar o trabalho da equipe:
- Responda as mensagens.
- Dê clareza sobre as prioridades do dia.
- Alinhe revisões e desbloqueie o fluxo de trabalho.
Quando você começa o dia garantindo que todos sabem o que fazer e como fazer, você maximiza o impacto do tempo da equipe. E essa é a diferença entre um time “perdido” e um time que entrega resultados extraordinários.
E por que isso funciona?
Porque uma tarefa básica e necessária, como organizar as entregas do time, organizar as gravações do dia, elaborar as legendas e títulos, sempre deve vir antes de uma tarefa complexa e necessária. O básico destrava o resto.
E, se Epicuro pudesse falar com você agora, ele diria algo como:
Reduza o ruído. Trabalhe com o time pela manhã. Entregue o necessário com foco e deixe o complexo para depois do café.